O XIII Fórum Jurídico de Lisboa, apelidado nas redes sociais de Gilmarpalooza, virou o mais recente escândalo da promíscua relação entre os Três Poderes no Brasil — em especial, entre ministros do Supremo Tribunal Federal, parlamentares do Centrão e empresários com interesses diretos em ações na mais alta Corte do país.
O evento, que deveria ser um fórum de debates sobre segurança jurídica e democracia, escancarou a realidade da “República da Impunidade”. Segundo dados revelados pela imprensa e confirmados por documentos públicos, o encontro custou aos cofres públicos mais de R$ 1 milhão em diárias, passagens e hospedagens pagas com dinheiro público — em plena crise econômica e social que assola o Brasil.
Turismo jurídico em Lisboa
Sob o pretexto de um seminário acadêmico, dezenas de autoridades brasileiras se reuniram na capital portuguesa, em um ambiente que mais parecia uma convenção de conchavos políticos e negociações de bastidores. Entre os participantes, figuravam:
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Gilmar Mendes, ministro do STF e organizador do evento via IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público);
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Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados;
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Rodrigo Pacheco, presidente do Senado;
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Bruno Dantas, presidente do TCU;
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Além de empresários investigados e parlamentares com ações tramitando no STF.
Em vez de promover a separação entre os Poderes, o evento se tornou o símbolo daquilo que muitos juristas chamam de “conluio institucional”.
Conflito de interesses escancarado
Alguns dos presentes no evento têm ações em julgamento no STF ou são alvo de investigações no TCU e na PGR. A presença de ministros da Corte no mesmo espaço que esses interessados, muitas vezes em jantares reservados ou passeios turísticos por Lisboa, levanta dúvidas legítimas sobre a imparcialidade do Judiciário brasileiro.
Há casos de ministros viajando com esposas ou familiares, sem agenda institucional clara, enquanto autoridades do Legislativo e empresários tratavam de “reformas”, “acordos políticos” e “estabilidade jurídica”. Tudo financiado com verbas públicas.
Mais de R$ 1 milhão em gastos públicos
A reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelou que mais de R$ 1 milhão em recursos públicos foi usado para custear a ida de autoridades ao fórum. O TCU pagou R$ 101 mil em diárias e passagens para seus membros. O STF autorizou diárias para ministros e assessores. O Congresso também arcou com despesas parlamentares.
Enquanto isso, hospitais públicos operam no limite, escolas carecem de estrutura básica e a população sofre com a carestia. O “Gilmarpalooza” mostra como uma elite político-judiciária vive em um mundo à parte, alheio ao sofrimento do povo brasileiro.
Silêncio cúmplice e ausência de indignação institucional
O mais estarrecedor não é apenas a promiscuidade do evento, mas o silêncio cúmplice das instituições. Não houve qualquer manifestação de repúdio formal por parte do STF, do CNJ ou do Ministério Público Federal. Tampouco se viu qualquer ação da imprensa tradicional para exigir responsabilização.
Pelo contrário: boa parte da cobertura foi conivente, tratando o evento como “normal” ou “rotineiro”. A narrativa institucionalizada é de que “eventos internacionais fortalecem a democracia”, ainda que essa democracia se resuma a vinhos caros, passaportes diplomáticos e conversas fora dos autos.
Conclusão: o Brasil real e o Brasil da toga
Enquanto o cidadão comum sofre com desemprego, violência e serviços públicos precários, uma casta de autoridades viaja a Lisboa para confraternizar às custas do erário. O Gilmarpalooza se tornou um símbolo da arrogância institucional e da falência da ética pública no Brasil.
Diante dos fatos, fica a pergunta: quem julga os julgadores? E até quando a sociedade brasileira aceitará calada esse teatro de privilégios travestido de “debate jurídico”?
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O XIII Fórum Jurídico de Lisboa, apelidado nas redes sociais de Gilmarpalooza, virou o mais recente escândalo da promíscua relação entre os Três Poderes no Brasil — em especial, entre ministros do Supremo Tribunal Federal, parlamentares do Centrão e empresários com interesses diretos em ações na mais alta Corte do país.O evento, que deveria ser um fórum de debates sobre segurança jurídica e democracia, escancarou a realidade da “República da Impunidade”. Segundo dados revelados pela imprensa e confirmados por documentos públicos, o encontro custou aos cofres públicos mais de R$ 1 milhão em diárias, passagens e hospedagens pagas com dinheiro público — em plena crise econômica e social que assola o Brasil.Turismo jurídico em LisboaSob o pretexto de um seminário acadêmico, dezenas de autoridades brasileiras se reuniram na capital portuguesa, em um ambiente que mais parecia uma convenção de conchavos políticos e negociações de bastidores. Entre os participantes, figuravam:Gilmar Mendes, ministro do STF e organizador do evento via IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público);Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados;Rodrigo Pacheco, presidente do Senado;Bruno Dantas, presidente do TCU;Além de empresários investigados e parlamentares com ações tramitando no STF.Em vez de promover a separação entre os Poderes, o evento se tornou o símbolo daquilo que muitos juristas chamam de “conluio institucional”.Conflito de interesses escancaradoAlguns dos presentes no evento têm ações em julgamento no STF ou são alvo de investigações no TCU e na PGR. A presença de ministros da Corte no mesmo espaço que esses interessados, muitas vezes em jantares reservados ou passeios turísticos por Lisboa, levanta dúvidas legítimas sobre a imparcialidade do Judiciário brasileiro.Há casos de ministros viajando com esposas ou familiares, sem agenda institucional clara, enquanto autoridades do Legislativo e empresários tratavam de “reformas”, “acordos políticos” e “estabilidade jurídica”. Tudo financiado com verbas públicas.Mais de R$ 1 milhão em gastos públicosA reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelou que mais de R$ 1 milhão em recursos públicos foi usado para custear a ida de autoridades ao fórum. O TCU pagou R$ 101 mil em diárias e passagens para seus membros. O STF autorizou diárias para ministros e assessores. O Congresso também arcou com despesas parlamentares.Enquanto isso, hospitais públicos operam no limite, escolas carecem de estrutura básica e a população sofre com a carestia. O “Gilmarpalooza” mostra como uma elite político-judiciária vive em um mundo à parte, alheio ao sofrimento do povo brasileiro.Silêncio cúmplice e ausência de indignação institucionalO mais estarrecedor não é apenas a promiscuidade do evento, mas o silêncio cúmplice das instituições. Não houve qualquer manifestação de repúdio formal por parte do STF, do CNJ ou do Ministério Público Federal. Tampouco se viu qualquer ação da imprensa tradicional para exigir responsabilização.Pelo contrário: boa parte da cobertura foi conivente, tratando o evento como “normal” ou “rotineiro”. A narrativa institucionalizada é de que “eventos internacionais fortalecem a democracia”, ainda que essa democracia se resuma a vinhos caros, passaportes diplomáticos e conversas fora dos autos.Conclusão: o Brasil real e o Brasil da togaEnquanto o cidadão comum sofre com desemprego, violência e serviços públicos precários, uma casta de autoridades viaja a Lisboa para confraternizar às custas do erário. O Gilmarpalooza se tornou um símbolo da arrogância institucional e da falência da ética pública no Brasil.Diante dos fatos, fica a pergunta: quem julga os julgadores? E até quando a sociedade brasileira aceitará calada esse teatro de privilégios travestido de “debate jurídico”?
Por Marcos Soares
Jornalista – Analista Político