O discurso de “imparcialidade” repetido pelo ministro Alexandre de Moraes diante das câmeras começa a ruir à luz de novos documentos e denúncias. Durante uma sessão plenária no Supremo Tribunal Federal (STF) em março deste ano, Moraes afirmou que os julgamentos dos manifestantes do 8 de janeiro respeitaram o devido processo legal, com ampla defesa e penas proporcionais aos “atos golpistas”.
Segundo ele, a Procuradoria-Geral da República (PGR) chegou a oferecer um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) para os acusados que confessassem crimes, como forma de “encerrar o tormento judicial”. Para o ministro, quem recusou o acordo “queria mesmo uma intervenção militar no Brasil”.
Mas a versão oficial não resiste ao confronto com os fatos. As prisões em massa, muitas delas arbitrárias, se tornaram marca registrada de um processo que, segundo juristas e defensores de direitos humanos, atropelou garantias constitucionais. Pessoas que sequer estavam em Brasília no dia 8 de janeiro figuram entre as presas e processadas, num cenário que mais lembra perseguição política do que justiça.
As entranhas desse sistema vieram à tona na chamada Vaza Toga — série de reportagens da Folha de S. Paulo divulgada no ano passado. O material expôs a atuação parcial de Moraes como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições de 2022, interferindo em favor de Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, o escândalo ganha um segundo capítulo, ainda mais explosivo.
Documentos e relatos de ex-assessores do TSE, a nova investigação revela que o grupo interno apelidado de “Ministério da Verdade” operava como um braço informal de censura e monitoramento de opositores políticos. O objetivo: identificar, perseguir e neutralizar vozes críticas ao governo e ao próprio STF.
Os dados mostram que dezenas de manifestantes foram mantidos em regime de prisão preventiva por meses, sem julgamento e sem provas concretas de participação em atos de depredação. Em alguns casos, a única “evidência” era a presença em grupos de mensagens ou a publicação de opiniões contrárias ao resultado das eleições.
Tais práticas ferem diretamente artigos da Constituição que garantem a liberdade de expressão, o direito à ampla defesa e a presunção de inocência. Estamos diante de um estado de exceção disfarçado de normalidade democrática.
O contraste entre a retórica de Moraes e a realidade exposta pelos documentos é gritante. Enquanto no plenário do STF o ministro fala em respeito aos trâmites legais, os bastidores revelam um esquema de repressão, marcado por prisões políticas e restrições à liberdade de opinião.
A nova leva de documentos enviadas ao exterior por Eduardo Tagliaferro, ex-assessor do ministro Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) promete manter o caso no centro do debate público. Mais do que um capítulo da história recente do Brasil, o 8 de janeiro pode se consolidar como símbolo de um Judiciário que ultrapassou os limites do seu papel constitucional.
O que para muitos foi um dia de caos e vandalismo na Praça dos Três Poderes, para o ministro Alexandre de Moraes representou uma janela histórica para expandir sua influência no Supremo Tribunal Federal (STF) e no cenário político nacional. O episódio de 8 de janeiro de 2023 serviu como catalisador para uma série de medidas judiciais e políticas que reforçaram, de maneira inédita, o poder concentrado nas mãos de um único magistrado.
Desde as primeiras horas após a invasão das sedes dos Três Poderes, Moraes assumiu a dianteira das investigações, determinando prisões em massa, bloqueio de redes sociais e imposição de sigilo em processos-chave. O argumento era proteger a democracia e punir os responsáveis —as ações abriram espaço para abusos e violações de garantias constitucionais.
Entre as decisões polêmicas adotadas por Moraes no pós-8 de janeiro, destacam-se:
-
Prisões preventivas prolongadas sem julgamento.
-
Quebra de sigilo de jornalistas e influenciadores.
-
Ampliação do conceito de “atos antidemocráticos” para enquadrar críticas ao STF.
-
Uso de decisões monocráticas para impor bloqueios e suspensões de contas em redes sociais.
Até que ponto a defesa da democracia pode justificar a erosão das próprias garantias democráticas?
A imparcialidade do STF virou peça de ficção. E como toda boa ficção, está cheia de vilões, manipulação e um roteiro bem ensaiado.
Por Marcos Soares
Jornalista – Analista Político instagram.com/@marcossoaresrj | instagram.com/@falageraltv
Todos os dias sempre um novo artigo com opinião e análises políticas.