Facções criminosas e milícias tomam conta do Rio enquanto Estado se torna espectador de sua própria falência.
De um lado, o Cristo Redentor observa silenciosamente a cidade que um dia foi cartão-postal do Brasil. Do outro, morros dominados por traficantes, milicianos e fuzis de guerra ditam as regras onde o Estado já não pisa. O Rio de Janeiro parece ter sido entregue — ou rendido — ao poder paralelo. Facções criminosas comandam bairros inteiros, impõem toque de recolher, proíbem a circulação de ônibus, cobram “pedágio” do comércio e aterrorizam a população com uma guerra sangrenta por território. E o governo? Quase sempre ausente.
O que se vê hoje no Rio não é apenas insegurança: é a falência institucional de um estado dominado por interesses escusos, onde o crime deixou de ser exceção e passou a ser estrutura de poder. A bandidagem está armada com material bélico digno de forças militares — e, muitas vezes, superior ao arsenal das próprias polícias. O tráfico desafia o Estado não apenas com balas, mas com propaganda, assistencialismo e influência política.
Nos últimos meses, a disputa entre facções como Comando Vermelho, Terceiro Comando Puro e as milícias voltou a incendiar comunidades. No Complexo da Penha, na Maré, em Jacarepaguá, em Itaguaí e até na Baixada Fluminense, a população vive sob constante ameaça. Crianças sem aula, comerciantes extorquidos, trabalhadores impedidos de sair de casa. Um cotidiano distorcido pela lógica da guerra civil não declarada.
Milícias e tráfico: dois rostos da mesma tragédia
Antes rivais, hoje em alguns casos aliados, os grupos armados se expandem onde há vácuo de Estado. A milícia, formada em parte por ex-policiais, controla áreas com métodos mafiosos: cobra por segurança, transporte, TV a cabo e até pela compra de imóveis. Já o tráfico, cada vez mais ousado, explora desde o narcotráfico até o mercado de gás e festas ilegais. Ambos agem com impunidade — e, em muitos casos, com o olhar cúmplice de agentes públicos.
As operações policiais, quando acontecem, são pontuais e ineficazes. Em vez de desarticular os esquemas, geram tragédias, tiroteios em horário escolar, e mortes de inocentes. As estatísticas são alarmantes, mas o governo insiste em uma retórica de “ações estratégicas”, enquanto comunidades inteiras clamam por socorro.
O silêncio das autoridades e a normalização do caos
Enquanto o sangue escorre nos becos, o Palácio Guanabara tenta manter a imagem de estabilidade. O governo estadual se limita a declarações protocolares. O governo federal, por sua vez, assiste de longe, como se o Rio fosse um problema alheio. Não há plano concreto, nem federalização da segurança, nem articulação entre forças armadas, inteligência e política pública. Há apenas o silêncio — e, por vezes, a conveniência.
A omissão institucional transformou o Rio em um exemplo trágico de como o abandono estatal abre espaço para que o crime se torne o verdadeiro poder. Em algumas regiões, o “governo” que a população conhece atende por apelidos de chefes do morro ou milicianos.
E quando um Estado perde o controle, a pergunta que resta é: quem está, de fato, governando?
Por Marcos Soares
Jornalista – Analista Político instagram.com/@marcossoaresrj | instagram.com/@falageraltv
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