O que antes era alvo de denúncias isoladas e análises de bastidores, agora ganha contornos oficiais: o Partido dos Trabalhadores (PT) decidiu institucionalizar o que por anos operou nas sombras — a formação de uma verdadeira milícia digital, agora com selo partidário, verba pública e estrutura de comando.
Na última semana, lideranças do partido anunciaram a criação de um núcleo de comunicação digital que atuará nas redes sociais com o objetivo declarado de “combater fake news” e “proteger a democracia”. Nos bastidores, porém, a movimentação tem sido vista por analistas políticos e membros da oposição como uma manobra para oficializar uma estrutura de ataque coordenado contra adversários políticos, jornalistas independentes e críticos do governo Lula.
De guerrilha digital a política de Estado
Desde os tempos da ascensão do lulismo, o PT manteve redes informais de influenciadores, artistas, blogueiros e perfis anônimos que agiam como linha auxiliar na propagação de narrativas e na desconstrução de opositores. Agora, essa operação ganha musculatura e legitimidade institucional, com direito a financiamento via Fundo Partidário e estrutura dentro da Fundação Perseu Abramo.
Documentos internos obtidos pela reportagem mostram a criação de uma “Rede Nacional de Comunicadores Populares”, que prevê a contratação de “combatentes digitais”, treinamento em técnicas de viralização e até mesmo um plano estratégico para ocupar espaços em plataformas como TikTok, Instagram e WhatsApp — redutos que o bolsonarismo dominou nos últimos anos.
Recursos públicos e aparelhamento da comunicação
Segundo levantamento feito com base nos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao menos R$ 12 milhões do fundo partidário serão alocados em 2025 para sustentar a nova engrenagem. O valor engloba salários, produção de conteúdo, contratação de agências e compra de impulsionamento digital.
O deputado federal Rogério Correia (PT-MG), um dos articuladores da iniciativa, defendeu a medida: “Estamos nos organizando para disputar o território digital, onde as mentiras contra o PT e Lula se espalharam com força. Agora temos a chance de responder à altura”.
Críticos, no entanto, veem outro cenário. Para o cientista político Lucas Farah, da UFRJ, “a institucionalização dessa máquina cria um ambiente tóxico no debate público. O partido passa a financiar diretamente a guerra de narrativas, com recursos que deveriam ser usados para fortalecer a democracia, não para sufocar a oposição”.
Alvos sob ataque
Relatos de jornalistas independentes, perfis conservadores e parlamentares da oposição apontam para uma intensificação de ataques orquestrados em redes sociais, especialmente após a eleição de Lula em 2022. “É um exército digital de camisas vermelhas. Eles atacam, difamam e tentam cancelar qualquer um que critique o governo”, denunciou Carla Zambelli (PL-SP), que foi alvo de uma campanha de desinformação em abril deste ano. O mesmo ocorreu com o deputado Nikolas Ferreira (PL) um dos políticos com a maior influência nas redes sociais.
A iniciativa também reacende o debate sobre censura e liberdade de expressão. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) publicou nota alertando para “os riscos de uso de estruturas partidárias para intimidar vozes dissidentes e manipular a opinião pública”.
A Confederação Brasileira de Jornalismo (CBJ) também se manifestou contra tais estruturas que buscam a descredibilizar a informação e atinge diretamente a pessoa.
Democracia ou manipulação?
Para seus defensores, o projeto é um antídoto contra o suposto “gabinete do ódio” bolsonarista. Para os críticos, trata-se de uma versão 2.0 da mesma prática que tanto acusaram e condenaram. O que está em jogo, dizem especialistas, é o limite ético do uso de recursos públicos para influenciar o debate público por vias não transparentes.
“Se o PT quiser realmente defender a democracia, precisa fazer isso com pluralidade, não com patrulha ideológica. Do contrário, estaremos diante de uma milícia digital oficializada pelo Estado”, resume o sociólogo Murilo Mendes.
O que diz o PT
Ao procurarmos, a assessoria do partido afirmou que “qualquer comparação com milícias digitais é descabida” e que “toda ação será pautada pela legalidade, pelo combate à desinformação e pela valorização da comunicação popular”.
Apesar da resposta, a movimentação do partido já provoca reações no Congresso. Líderes de partidos de oposição estudam acionar o TSE e o Ministério Público Eleitoral para apurar se há desvio de finalidade no uso de verba pública.
Enquanto isso, a nova milícia digital petista já está em campo — não mais escondida nos porões da internet, mas à luz do dia, com crachá partidário e verba garantida.
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