A decisão do governo dos Estados Unidos — anunciada pelo Secretário de Estado Marco Rubio — de revogar os vistos de entrada do ministro Alexandre de Moraes, de familiares diretos e de aliados na cúpula do Judiciário é mais que um ato administrativo: é um gesto político calculado, um sinal amarelo projetado diretamente sobre a atuação recente do STF e, em especial, sobre o método de poder concentrado em um único ministro.
Rubio justificou a medida evocando a expressão “caça às bruxas política” contra Jair Bolsonaro, linguagem dura que carrega implicações simbólicas: na diplomacia, escolher esse enquadramento é posicionar Moraes — e por reflexo o tribunal — no banco dos réus da narrativa global sobre liberdade de expressão e devido processo.
O pacote de restrições imposto recentemente a Bolsonaro (tornozeleira eletrônica, controle de movimentos, limitações de comunicação) serviu como estopim imediato para a escalada, alimentando a percepção em Washington (e entre aliados políticos de Trump) de que o processo assumiu contornos punitivos antes do desfecho judicial.
Nos bastidores, parlamentares e articuladores ligados ao bolsonarismo vinham pressionando autoridades norte‑americanas por sanções, reuniões que agora aparecem como pano de fundo da decisão: a ofensiva de lobby buscava algo ainda mais severo (sanções de tipo Magnitsky), mas a revogação coletiva de vistos já funciona como instrumento de constrangimento público.
A reação política brasileira dividiu-se em narrativas espelhadas: enquanto setores da oposição interpretam o gesto como validação de suas críticas ao “ativismo judicial”, figuras governistas e aliados do PT classificam a medida como ingerência e retaliação ideológica, tentando enquadrá-la como parte de uma articulação transnacional da extrema direita.
O ponto sensível para a imagem do STF é que, ao internacionalizar-se a crítica à atuação de Moraes, abre-se uma arena na qual argumentos sobre censura e extrapolação jurisdicional ganham oxigênio externo — um terreno onde a Corte deixa de controlar sozinha a moldura discursiva e passa a reagir a pressões reputacionais além das fronteiras brasileiras.
A narrativa de “defesa da liberdade de expressão” foi reforçada por políticos republicanos norte‑americanos, que já vinham usando o nome de Moraes como exemplo emblemático de autoridade estrangeira supostamente disposta a projetar decisões sobre plataformas e cidadãos fora de sua jurisdição — transformando o ministro em símbolo em debates domésticos dos EUA sobre Big Tech e censura.
Do ponto de vista estratégico, a revogação de vistos cria um precedente: se outros magistrados ou autoridades relacionadas a decisões controversas passarem a sofrer medidas similares, o STF enfrentará uma pressão horizontal inédita, na qual reputação externa e autoridade interna entram em atrito direto; isso alimenta a crítica interna de que o tribunal teria cruzado a linha entre guardião constitucional e ator político. (Inferência baseada no efeito diplomático de sanções de visto sobre autoridades judiciais em outros casos.)
Para Moraes, a resposta institucional necessária vai além de notas de repúdio: envolve reconstruir confiança procedimental e transparência das decisões que têm impacto sobre direitos políticos e liberdade comunicacional — caso contrário, a “janela de interpretação” permanecerá ocupada por narrativas de perseguição que agora circulam com chancela de um ato concreto da diplomacia norte‑americana.
Conclusão (Opinião): A revogação dos vistos funciona como um recado: a elasticidade do poder judicial tem limites na arena da percepção internacional. Ignorar esse sinal pode aprofundar o isolamento simbólico do STF e fortalecer discursos que o pintam como protagonista de um desequilíbrio entre Poderes — um risco que deveria acionar um debate interno urgente sobre critérios, proporcionalidade e comunicação de decisões sensíveis.
Por Marcos Soares
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